quinta-feira, 21 de abril de 2011

Nova versão.

Já baixou o jogo: StarShooter ? Não?
Então baixe agora, a nova versão (muito mais moderna).
StarShooter é um jogo de naves. Onde o objetivo, não é muito diferente dos demais jogos de mesmo estilo. (mas na minha opinião é muito mejor!!! rsrs)


ps: baixem também: Desafio da Bolacha

Bom jogo!

sábado, 9 de abril de 2011

O Coração Do Violinista

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Por: F. Sabino






DE REPENTE, meu amigo tentou liquidar a discussão, dizendo que bateria não é instrumento de música.
- Como não é instrumento de música? É instrumento de quê, então?
- De jazz .
- E jazz  não é música?
- Música para você: para mim não é.
- Toda orquestra sinfônica tem bateria.
- Nem por isso ela fica sendo instrumento de múscia.
- Por que não?
- Toda orquestra sinfônica tem maestro. Maestro é instrumento de música?
- Em certo sentido, é.
- Ora, você está é bêbado.
 Discutíamos por discutir, levados pela necessidade de manter aceso o interesse da conversa, enquanto tomávamos a nossa cerveja. Meu amigo voltou à carga:
 - Você não entende de instrumento de música. Se entende, me diga uma coisa: bateria é instrumento de percussão, não é isso mesmo?
- Tenho a impressão que sim.
- Tem a impressão, não: é instrumento de percussão. Agora me diga uma coisa: o piano. O piano é instrumento de corda ou de percussão?
 Embatuquei. Sempre tivera o piano na conta de instrumento de corda, ora essa era muito boa. Mas o diabo daqueles martelinhos lá dentro, percutindo nas cordas... Percussão? 
 - De corda - arrisquei.
 - Não senhor: de percussão - arrematou ele, triunfante, e chamou o garçom com um gesto, pedindo outra cerveja.
 Veio-me a certeza de que se eu tivesse falado " de percussão ", ele diria: " não senhor: de corda ". Agarrei-me à corda:
 - Percussão onde, senhor! De corda.
 - Percussão.
 - Corda.
 Dali partiríamos para os sopapos, se de súbito não tivesse entrado no bar o violinista triste. Vinha de um programa de televisão, onde mal aparecia, na terceira fila de uma orquestra. Mas não era por isso que ultimamente vivia triste: andava apaixonado, sabia- se , e não tivera ainda nem coragem de se declarar à sua amada, " uma mulher pra muito luxo ", dizia ele. Foi sentar- se a um canto, como sempre, pediu um conhaque. Imediatamente o convocamos para a nossa mesa, e veio, olhos de vaca mansa, trazendo seu cálice. Para ele tanto fazia sentar- se nesta como naquela, ora dane- se! estava apaixonado.
 - Você que é músico de verdade, vai dizer aqui uma última palavra: bateria é ou não é instrumento de música?
 - Piano é instrumento de percussão ou de corda?
 Mas o violinista triste não queria saber de nada, muito menos de conversa fiada de botequim. Lagou- nos um olhar desconsolado, soltou um suspiro que era um mugido tristíssimo, ergueu- se, levando o cálice ao peito:
 - E o coração... É instrumento de sopro ou de percussão?


Alguma explicação? parte I

       




A cena ao final de minha batalha ficará lembrada como a gota de tinta, que é vazada do pincel carregado pelo grande artista, onde o mesmo insiste na possibilidade de que sua obra também tome conta, conta de nossos pequenos, e de seus sonhos. O termo é significativo demais para o ser de sã consciência compreender a razão e efeito da custódia sem explicações adequadas para o início de estudos aprofundados tirados de grandes acadêmicos que se encontram num único lugar.
X
Sua noção de pureza é inexistente, e então me odiará – Ah sim! E queimarei no inferno! – como justa causa, quem pagará por sua insolência serão os de almas verdadeiras. Pagaram com dor, pois não estou de brincadeira, afirmo.
X
Agora que ‘ acertei as contas ’ com a sociedade, me livro de toda essa impureza que contaminou minha existência.
Afirmo que, de mau nenhum fiz, esse era meu destino. Mas que Deus abençoe a minha alma...

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quarta-feira, 6 de abril de 2011

O homem nu


Por: F. Sabino






 Ao acordar, disse para a mulher:
 - Escuta, minha filha: hoje é dia de pagar a prestação da televisão, vem aí o sujeito com a conta, na certa. Mas acontece que ontem não trouxe dinheiro da cidade, estou a nenhum.
 - Explique isso ao home - ponderou a mulher.
 - Não gosto dessas coisas. Dá um ar de vigarice, gosto de cumprir rigorosamente as minhas obrigações. Escuta: quando ele vier a gente fica aqui dentro, não faz barulho, para ele pensar que não tem ninguém. Deixa ele bater até cansar - amanhã eu pago.
 Pouco depois, tendo despido o pijama, dirigiu-se ao banheiro para tomar um banho, mas a mulher já se trancara lá dentro. Enquanto esperava, resolveu fazer o café. Pôs a água a ferver e abriu a porta de serviço para apanhar o pão.  Como estivesse completamente nu, olhou com cautela para um lado e para outro antes de arriscar-se a dar dois passos até o embrulhinho deixado pelo padeiro sobre o mármore do parapeito. Ainda era muito cedo, não poderia aparecer ninguém. Mal seus dedos, porém, tocavam o pão, a porta atrás de si fechou-se com estrondo, impulsionada pelo vento.
 Aterrorizado, precipitou-se até a campainha e, depois de tocá-la, ficou à espera, olhando ansiosamente ao redor. Ouviu lá dentro o ruído da água do chuveiro interromper-se de súbito, mas ninguém veio abrir. Na certa a mulher pensava que já era o sujeito da televisão. Bateu com o nó dos dedos.
 - Maria! Abre aí, Maria. Sou eu - chamou, em voz baixa.
 Quanto mais batia, mais silêncio fazia lá dentro.
 Enquanto isso ouvia lá embaixo a porta do elevador fechar-se, viu o ponterio subir lentamente os andares... Desta vez,  era o homem da televisão!
 Não era. Refugiado no lanço de escada entre os andares, esperou que o elevador passasse, e voltou para a porta de seu apartamento, sempre a segurar nas mãos nervosas o embrulho de pão:
 - Maria, por favor! Sou eu!
 Desta vez não teve tempo de insistir: ouviu passos na escada, lentos, regulares, vindos lá de baixo... Tomado de pânico, olhou ao redor, fazendo uma pirueta, e assim despido, embrulho na mão, parecia executar um  ballet grotesco e mal- ensaiado. Os passos na escada se aproximavam, e ele sem onde se esconder. Correu para o elevador, apertou o botão. Foi o tempo de abrir a porta e entrar, e a empregada passava, vagarosa, encetando a subida de mais um lanço de escada. Ele respirou aliviado, enchugando o suor da testa com o embrulho do pão. Mas eis que a porta interna do elevador se fecha e ele começa a descer.
 - Ah, isso é que não! - fez o homem nu, sobressaltado.
 E agora? Alguém lá embaixo abriria a porta do elevador e daria com ele ali, em pelo, podia mesmo ser algum vizinho conhecido... Percebeu, desorientado, que estava sendo levado cada vez mais longe de seu apartamento, começava a viver um verdadeiro pesadelo de Kafka, instaurava-se naquele momento o mais autêntico e desvairado Regime do Terror!
 - Isso é que não - repetiu, furioso.
 Agarrou-se à porta do elevador e abriu-a com força entre os andares, obrigando-o a aparar. Respirou fundo, fechando os olhos, para ter a momentânea ilusão de que sonhava. Depois esperimentou apertar o botão de seu andar. Lá embaixo continuavam a chamar o elevador. Antes de mais nada: " Emergência: parar". Muito bem. E agora? Iria subir ou descer? Com cautela desligou a parada de emergência, largou a porta, enquanto insistiu em fazer o elevador subir. O elevador subiu.
 - Maria! Abre esta porta! -  gritava, desta vez esmurrando a porta, já sem nenhuma caltela. Ouviu que outra porta se abria atrás de si. Voltou-se, acuado, apoiando o traseiro no batente e tentando inutilmente cobrir-se com o embrulho de pão. Era a velha do apartamento vizinho:
 - Bom dia, minha senhora -  disse ele, confuso. - Imagine que eu...
 A velha estarrecida, atirou os braços para cima, soltou um gito:
 - Valha-me Deus! O padeiro está nu!
 E correu ao telefone apara chamar a raiopatrulha:
 - Tem um homem pelado aqui na porta!
 Outros vizinhos, ouvindo a gritaria, vieram ver o que se passava:
 - É um tarado!
 - Olha, que horror!
 - Não olha não! Já pra dentro, minha filha!
 Maria, a esposa do infeliz, abriu finalmente a porta para ver o que era. Ele entrou como um foguete e vestiu-se preciptadamente, sem nem se lembrar do banho. Poucos minutos depois, restabelecida a calma lá fora, vateram na porta.
 - Deve ser  a polícia - disse ele, ainda ofegante, indo abrir.
 Não era: era o cobrador da televisão.
 

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Doce Novembro...









Nas ruas desprezo quem sorriu pra mim
Não vê que por dentro eu já cheguei ao fim
E aceito a sorte que a vida me deu
Mas pena é pros fracos que o mundo já esqueceu

O seu desespero ilude
Que é sua essa dor
O choro que te cai
Só consola você

Amanhã é cedo pra estar melhor
Amanhã é cedo pra mim
Me agonia o medo de ficar só
Me sinto só enfim

Só vejo lamento no que eu não fiz
Quem sofre não cuida de laços ou verniz

O seu desespero ilude
Que é sua essa dor
O choro que te cai
Só consola você

Amanhã é cedo pra estar melhor
Amanhã é cedo pra mim
Me agonia o medo de ficar só
Me sinto só enfim

Um doce novembro que foge de mim
Assina o passado enquanto eu sinto o fim




Música: Marjorie Estiano
Contato: Marjorie Estiano


Hoje acordei pensando nessa música, a Marjorie é incrível!
**Adoooro o guns, é a minha banda preferida... mas é como se sua voz me prendesse
ao passado (épocas inesquecíveis...). E não tenho vergonha de dizer que gosto de MPB, rs.**
Sou meio "patriota", gosto de música naciona ( das que prestam), inclusive as dela ! 
Un bise chéris!

quinta-feira, 31 de março de 2011

Vamos???






Então, te contaram? O melhor guitarrista da banda Guns N' Roses em SP. 
Sim, e não é propaganda enganosa!
Sua master apresentação será no dia 7 de Abril às 21:00 hrs, no HSBC Brasil *0*
Por mim eu já estaria lá! rs.
Slash! Slash! Slash! Slash! Slash! Slash! Slash! Slash! Slash! Slash! Slash! Slash! Slash!




(pra quem não sabe, minha banda preferida é o guns, rs.**

quarta-feira, 30 de março de 2011

Venha Ver o Pôr do Sol...


Por: Lygia F. Telles
Parte I


 Ela subiu sem pressa a tortuosa ladeira. À medida que avançava, as casas iam rareando, modestas casas espalhadas sem simetria e ilhadas em terrenos baldios. No meio da rua sem calçamento, coberta aqui e ali por um mato rasteiro, algumas crianças brincavam de roda. A débil cantiga infantil era a única nota viva na quietude da tarde.
 Ele a esperava encostado a uma árvore. Esgio e magro, metido num largo blusão azul-marinho, cabelos crescidos e desalinhados, tinha um jeito jovial de estudante.
 - Minha querida Raquel.
 Ela encarou-o, séria. e olhou para os próprios sapatos.
 - Veja que lama. Só mesmo você inventaria um encontro num lugar destes. Que ideia Ricardo, que ideia! Tive que descer do táxi lá longe, jamais ele chegaria aqui em cima.
 Ele riu entre malicioso e ingênuo.
 - Jamais? Pensei que viesse vestida esportivamente e agora me aparece nessa elegância. Quando você andava comigo, usava uns sapatões de sete léguas, lembra?
 - Foi para me dizer isso que você me fez subir até aqui?- perguntou ela, guardando as luvas na bolsa. Tirou um cigarro. - Hein?!
  - Ah, Raquel...- ele tomou-a pelo braço. - Você está uma coisa de linda. E fuma agora uns cigarrinhos pilantras, toda essa beleza, sentir esse perfume. Então? Fiz mal?
 - Podia ter escolhido um outro lugar, não? - Abrandara a voz. - E o que é isso aí? Um cemitério?
 Ele voltou-se para o velho muro arruinado. Indicou com o olhar o portão de ferro, carcomido pela ferrugem.
 - Cemitério abandonado, meu anjo. vivos e mortos, desertaram todos. Nem os fantasmas sobraram, olha aí como as criancinhas brincam sem medo - acrescentou apontando as crianças na sua ciranda.
  Ela tragou lentamente. Soprou a fumaça na cara do companheiro.
 - Ricardo e suas ideias. E agora? Qual é o programa?
 Brandamente ele a tomou pela cintura.
 - Conheço bem tudo isso, minha gente está enterrada aí. Vamos entrar um instante e te mostrarei o pôr do sol mais lindo do mundo.
 Ela encarou-o um instante. E vergou a cabeça para trás numa risada.
 - Ver o pôr do sol? Ah, meu Deus... Fabuloso, fabuloso! Me implora um último encontro, ma atormenta dias seguidos, me faz vir de longe para esta buraqueira, só mais uma vez, só mais uma! E para quê? Para ver o pôr so sol num cemitério.
 Ele riu também, afetando encabulamento como um menino pilhado em falta.
 - Raquel, minha querida, não faça assim comigo. Você sabe que eu gostaria era de te levar ao meu apartamento, mas fiquei mais pobre ainda, como se isso fosse possível. Moro agora numa pensão horrenda, a dona é uma Medusa que vive espiando pelo buraco da fechadura.
 - E você acha que eu iria?
 - Não se zangue, sei que não iria, você está sendo fidelíssima. Então pensei, se pudéssemos conversar um pouco numa rua afastada... - disse ele, aproximando-se mais.
 Acariciou-lhe o braço com as pontas dos dedos. Ficou sério. E aos poucos inúmeras rugazinhas foram-se  formando em redor dos seus olhos ligeiramente apertados. Os leques de rugas se aprofundaram numa expressão astuta. Não era nesse instante tão jovem como aparentava. Mas logo sorriu e a rede de rugas desapareceu sem deixar vestígio. Voltou-lhe novamente o ar inexperiente e meio desatento.
 - Você fez bem em vir.
 - Quer dizer que o programa... E não podíamos tomar alguma coisa num bar?
 - Estou sem dinheiro, meu anjo, vê se entende.
 - Mas eu pago.
 - Com o dinheiro dele? Prefiro beber formicida. Escolhi este passeio porque é de graça e muito decente, não concorda comigo? Até romântico.
 Ela olhou em redor. Puxou o braço que ele apertava.
 - Foi um risco enorme, Ricardo. Ele é ciumentíssimo. Está farto de saber que tive meus casos. Se nos pilha juntos, então sim, quero só ver se alguma das suas fabulosas ideias vai me concertar a vida.
 - Mas me lembrei deste lugar justamente porque não quero que você se arrisque, meu anjo. Não tem lugar mais discreto do que um cemitério abandonado, veja, completamente abandonado - prosseguiu ele, abrindo o portão. Os velhos gonzos gemeram. - Jamais seu amigo ou um amigo do seu amigo saberá que estivemos aqui.
 - É um risco enorme, já disse. Não insista nessas brincadeiras, por favor. E se vem um enterro? Não suporto enterros.
 - Mas enterro de quem? Raquel, Raquel, quantas vezes preciso repetir a mesma coisa? Há séculos ninguém mais é enterrado aqui, acho que nem os ossos sobraram, que bobagem. Vem comigo, pode me dar o braço, não tenha medo.

Venha Ver o Pôr do Sol...



Parte II
Por: Lygia F. Telles

O mato rasteiro dominava tudo. E não satisfeito de ter-se alastrado furioso pelos canteiros, subira pelas sepulturas, infiltrara-se ávido pelos rachões dos mármores, invadira as alamedas de pedregulhos esverdinhados, como se quisesse com sua violenta força de vida cobrir para sempre os últimos vestígios da morte. Foram andando pela longa alameda banhada de sol. Os passos de ambos ressoavam sonoros como uma estranha música feita do som das folhas secas trituradas sobre os pedregulhos. Amuada as obediente, ela se deixava conduzir como uma criança. Às vezes mostrava certa curiosidade por uma ou outra sepultura como os pálidos medalhões de retratos esmaltados.
 - É imenso, hein? E tão miserável, nunca vi um cemitério mais miserável, que deprimente - exclamou ela, atirando a ponta do cigarro na direção de um anjinho de cabeça decepada. - Vamos embora Ricardo, chega.
 - Ah Raquel, olha um pouco para esta tarde! Deprimente por quê? Não sei onde foi que eu li, a beleza não está no crepúsculo, nesse meio-tom, nessa ambiguidade. Estou-lhe dando um crepúsculo numa bandeja e você se queixa.
 - Não gosto de cemitério, já disse. E ainda mais cemitério pobre.
 Delicadamente ele beijou-lhe a mão.
 - Você prometeu dar um fim de tarde a este seu escravo.
 - É, mas fiz mal. Pode ser muito engraçado, mas não quero me arriscar mais.
 - Ele é tão rico assim?
 - Riquíssimo. Vai me levar agora numa viagem fabulosa até o Oriente. Já ouviu falar no Oriente? Vamos até o Oriente, meu caro.
 Ele apanhou um pedregulho e fechou-o na mão. A pequenina rede de rugas voltou a se estender em redor dos seus olhos. A fisionomia, tão aberta e lisa, repentinamente escureceu, envelhecida. Mas logo o sorriso reapareceu e as rugazinhas sumiram.
 - Eu também te levei um dia para passear de barco, lembra?
 Recostando a cabeça no ombro do homem, ela retardou o passo.
 - Sabe Ricardo, acho que você é meio tantã... Mas apesar de tudo, tenho às vezes saudade daquele tempo. Que ano aquele. Quando penso, não entendo como aguentei tanto, imagine, um ano!
 - É que você tinha lido A Dama da Camélias , ficou assim toda frágil, toda sentimental. E agora? Que romance você está lendo agora?
 - Nenhum - respondeu ela franzindo os lábios. Deteve-se para ler a inscrição de uma laje despedaçada: - À minha querida esposa, eternas saudades- leu em voz baixa. - Pois sim. durou pouco essa eternidade.
 Ele atirou o pedregulho num canteiro ressequido.
 - Mas é esse abandono na morte que faz o encanto disto. Não se encontra mais a menor intervenção dos vivos, a estúpida intervenção dos vivos. Veja - disse apontando uma sepultura fendida, a erva daninha brotando insólita de dentro da fenda - o musgo já cobriu o nome da pedra. Por cima do musgo ainda virão as raízes, depois as folhas... Esta, a morte perfeita, nem lembrança, nem saudade, nem o nome sequer. Nem isso.
 Ela aconchegou-se mais a ele. Bocejou.
 - Está bem, mas agora vamos embora que já me diverti muito, faz tempo que não me divirto tanto, só mesmo um cara como você podia me fazer divertir assim. - Deu-lhe um rápido beijo na face. - Chega, Ricardo, quero ir embora.
 - Mais alguns passos...
 - Mas este cemitério não acaba mais, já andamos quilômetros! - Olhos para trás. - Nunca andei tanto, Ricardo, vou ficar exausta.
 - A boa vida te deixou preguiçosa? Que feio - lamentou ele, impelindo-a para frente. - Dobrando esta alameda, fica o jazido da minha gente, é de lá que se vê o pôr do sol. Sabe, Raquel, andei muitas vezes por aqui de mãos dadas com minha prima. Tínhamos então doze anos. Todos os domingos minha mãe vinha trazer flores e arrumar nossa capelinha onde já estava enterrado meu pai. Eu e minha priminha vínhamos com ela e ficávamos por aí, de mãos dadas, fazendo tantos planos. Agora as duas estão mortas. 

Venha Ver o Pôr do Sol

Parte III
Por: Lygia F. Telles

 - Sua prima também?
 - Também. Morreu quando completou quinze anos. Não era propriamente bonita. mas tinha uns olhos... Eram assim verdes como os seus, parecidos com os seus. Extraordinário, Rauqel, extraordinário como vocês duas... Penso agora que toda a beleza dela residia apenas nos olhos, assim meio oblíquos, como os seus.
 - Vocês se amaram?
 - Ela me amou. Foi a única criatura que... - Fez um gesto. - Enfim, não tem importância.
 Raquel tirou-lhe o cigarro, tragou e depois devolveu-o.
 - Eu gostei de você, Ricardo.
 - E eu te amei. E te amo ainda. Percebe agora a diferença?
 Um pássaro rompeu o cipreste e soltou um grito. Ela estremeceu.
 - Esfriou, não? Vamos embora.
 - Já chegamos, meu anjo. Aqui estão meus mortos.
 Pararam diante de uma capelinha coberta de alto a baixo por uma trepadeira selvagem, que a envolvia num furioso abraço de cipós e folhas. A estreita porta rangeu quando ele a abriu de par em par. A luz invadiu um cubículo de paredes enegrecidas, cheias de estrias de antigas goteiras. No centro do cubículo, um altar meio desmantelado, coberto por uma toalha que adquirira a cor do tempo. Dois vasos de desbotada opalina ladeavam um tosco crucifixo de madeira. Entre os braços da cruz, uma aranha tecera dois triângulos de teias já rompidas, pendendo como farrapos de um manto que alguém colocara sobre os ombros do Cristo. Na parede lateral, à direita da porta, uma portinhola de ferro dando acesso para uma escada de pedra descendo em caracol para a catacumba.
 Ela entrou na ponta dos pés, evitando roçar memso de leve naqueles restos da capelinha.
 - Que triste que é isto, Ricardo. Nunca mais você esteve aqui?
 Ele tocou na face da imagem recoberta de poeira. Sorriu, melancólico.
 - Sei que você gostaria de encontrar nos vasos, velas, sinais da minha dedicação, certo? Mas já disse que o que mais amo neste cemitério é precisamente este abandono, esta solidão. As pontes com o outro mundo foram cortadas e aqui a morte se isolou total. Absoluta.
 Ela adiantou-se e espiou através das enferrujadas barras de ferro da portinhola. Na semiobscuridade do subsolo, os gavetões se estendiam ao longo das quetro paredes que formavam um estreito retângulo cinzento.
 - É lá embaixo?
 - Pois lá estão as gavetas. E nas gavetas, minhas raízes. Pó, meu anho, pó - murmurou ele.
 Abriu a portinhola e desceu a escada. Aproximou-se de uma gaveta no centro da parede, segurando firme a alça de bronze, como se fosse puxá-la.
 - A cômoda de pedra. Não é grandiosa?
 Detendo-se no topo da escada, ela inclinou-se mais para ver melhor.
 - Todas essas gavetas estão cheias?
 - Cheias?... Só as que têm um retrato e a inscrição, está vendo? Nesta está o retrato da minha mãe, aqui ficou minhas mãe - prosseguiu ele tocando com os dedos num medalhão esmaltado, embutido no centro da gaveta.
 Ela cruzou os braços. Falou baixinho, um ligeiro tremos na voz. 
 - Vamos, Ricardo, vamos.
 - Você está com medo.
 - Claro que não, estou é com fio. Suba e vamos embora, estou com frio.
 Ele não respondeu. Adiantara-se até um dos gavetões na parede oposta e acendeu um fósforo. Inclinou-se para o medalhão frouxamente iluminado.

Venha Ver o Pôr do Sol

Parte IV (Final)
Por: Lygia F. Telles


 - A priminha Maria Emília. Lembro-me até do dia em que tirou esse retrato, duas semanas antes de morrer... Prendeu os cabelos com uma fita azul e veio se exibir, estou bonita? Estou bonita? - falava agora consigo mesmo, doce e gravemente. - Não é que fosse bonita, mas os olhos... Venha ver Raquel, é impressionante como tinha olhos iguais aos seus.
  Ela desceu a escada, encolhendo-se para não esbarrar em nada.
 - Que frio faz aqui. E que escuro, não estou enxergando!
 Acendendo outro fósforo, ele ofereceu-o à companheira.
 - Pegue, dá para ver muito bem... - Afastou-se para o lado. - Repare nos olhos.
 - Mas está desbotado, mal se vê que é uma moça... - Antes da chama se apagar, aproximou-a da inscrição feita na pedra. Leu em vou alta, lentamente: - Maria Emília, nascida em vinte de maio de mil oitocentos e falecida... - Deixou cair o palito e ficou um instante imóvel. - Mas esta não podia ser sua namorada, morreu há mais de cem anos! Seu menti...
 Um baque metálico decepou-lhe a palavra pelo meio. Olhou em redor. A peça estava deserta. Voltou o olhar para a escada. No topo, Ricardo a observava por detrás da portinhola fechada. Tinha seu sorriso meio inocente, meio malicioso.
 - Isto nunca foi o jazido de sua família, seu mentiroso! Brincadeira mais cretina! -  exclamou ela, subindo rapidamente! - ordenou, torcendo o trinco. - Detesto este tipo de brincadeira, você sabe disso. Seu idiota! É no que dá seguir a cabeça de um idiota desses. Brincadeira mais estúpida!
 - Uma réstia de sol vai entrar pela frincha da porta, tem uma frincha na porta. Depois vai se afastando devagarinho, bem devagarinho. Você terá o pôr do sol mais belo do mundo. 
 Ela sacudia a portinhola.
 - Ricardo, chega, já disse! Chega! Abre imediatamente, imediatamente! - Sacudiu a portinhola com mais força ainda, agarrou-se a ela, dependurando-se por entre as grades. Ficou ofegante, os olhos cheios de lágrimas. Ensaiou um sorriso. - Ouça, meu bem, foi engraçadíssimo, mas preciso ir mesmo, vamos, abra...
 Ele já não sorria. Estava sério, os olhos diminuídos. Em redor deles, reapareceram as rugazinhas abertas em leque.
 - Boa noite, Raquel.
 - Chega, Ricardo! Você vai me pagar!... - gritou ela, estendendo os braços por entre as grades, tentando agarrá-lo. - Cretino! Me dá a chave desta porcaria, vamos! - exigiu, examinando a fechadura nova em folha. Examinou em seguida as grades cobertas por uma crosta de ferrugem. Imobilizou-se. Foi erguendo o olhar até a chave que ele balançava pela argola, como um pêndulo. Encarou-o, apertando contra a grade a face sem cor. Esbugalhou os olhos num espasmo e maleceu o corpo. Foi escorregando. - Não, não...
 Voltado ainda para ela, ele chegou até a porta e abriu os braços. Foi puxando as duas folhas escancaradas.
 - Boa noite, meu anjo.
 Os lábios dela se pregavam um ao outro, como se entre eles houvesse cola. Os olhos rodavam pesadamente numa esxpressão embrutecida.
 - Não...
 Guardando a chave no bolso, ele retomou o caminho percorrido. No breve silêncio, o som dos pedregulhos se entrechocando úmidos sob seus sapatos. E, de repente, o grito medonho, inumano:
 - Não!
 Durante algum tempo ele ainda ouviu os gritos que se multiplicaram, semelhantes aos de um animal sendo estraçalhado. Depois, os uivos foram ficando mais remotos, abafados como se viessem das profundezas da terra. Assim que atingiu o portão do cemitério, ele lançou ao poente um olhar mortiço. Ficou atento. Nenhum ouvido humano escutaria agora qualquer chamado. Acendeu um cigarro e foi descendo a ladeira. Crianças ao longe brincavam de roda.